Cultura para o desenvolvimento
Caracterizado como saci, ator e professor Erinaldo Cardoso Lima faz performance na avenida Paulista Karime Xavier/Folhapress
Por Folha de S. Paulo https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2022/06/cultura-para-o-desenvolvimento.shtml#_=_
Alê Youssef
Muita gente hoje olha para a força cultural da Inglaterra com naturalidade, como se fosse um fenômeno espontâneo. Nada disso. A potência cultural do país foi planejada.
A "Creative Industries Task Force" (Força-Tarefa das Indústrias Criativas), criada em 1998 no Reino Unido, foi um marco global na aproximação da cultura com agendas de desenvolvimento. Na ocasião, a terra dos Beatles, de Vivienne Westwood e de Banksy mapeou as atividades dos setores considerados parte das indústrias criativas, avaliando suas contribuições à economia e identificando políticas públicas que poderiam promover e alavancar o seu desenvolvimento. Como desdobramento, foi publicado o "Creative Industries Mapping Document" (mapa das indústrias criativas), que posicionou o setor como aquele que tem sua origem na criatividade individual, na habilidade e no potencial de geração de emprego e renda.
No mesmo ano, para superar a crise asiática, o governo sul-coreano ampliou consideravelmente o orçamento do Ministério da Cultura e criou um departamento especial dedicado à cultura popular, que em pouco tempo foi apelidado de K-Pop. Em 2005, um fundo de US$ 1 bilhão foi destinado ao setor e, em 2012, a música "Gangnam Style", de PSY, já tomava conta do mundo, preparando terreno para o fenômeno pop BTS, grupo musical que sozinho movimenta mais de US$ 3 bilhões na economia do país.
Quanto mais dinheiro girando, mais empregos, renda e investimentos públicos e privados para o setor cultural da Coreia do Sul. As quatro estatuetas do Oscar de 2020 para "Parasita", de Bong Joon Ho, incluindo melhor filme, e o fenômeno "Round 6", série mais vista da história da Netflix, são exemplos dessa potência.
A lista é extensa e poderia incorporar a experiência de Portugal, que se transformou em um dos destinos mais procurados pelas juventudes criativas do mundo, e a Colômbia, que adaptou os conceitos da economia criativa para sua realidade latino-americana e criou as bases para a chamada "economia laranja".
Fato é que a cultura e a criatividade mostram-se geradoras de valor e oportunidades, inclusive em meio a crises globais. A economia criativa é mais resiliente, dinâmica e conectada ao mundo digital, com ampla capacidade de transformação e adaptação. Além disso, tem baixo impacto ambiental e colabora com o compromisso civilizatório de nossa geração em buscar alternativas sustentáveis de desenvolvimento.
Nesse contexto, é inquestionável que o Brasil, reconhecido por sua diversidade ambiental e cultural, além da competência de realizar a maior festa popular do planeta, deveria ter há tempos optado por esse caminho.
Nosso querido país, tão machucado nos últimos anos por ações antidemocráticas e ataques constantes ao setor cultural, pode dar uma guinada histórica ao colocar sua cultura a serviço do desenvolvimento econômico e social através de um plano estratégico nacional que mergulhe fundo no imenso potencial criativo de cada estado brasileiro para gerar milhares de empregos. É preciso superar o falso antagonismo entre economia da cultura e valor das expressões artísticas. Apostar na economia criativa não significa diminuir a necessidade de investimento público no setor, pelo contrário.
É hora de buscar um ciclo virtuoso que una classe artística, produtores, gestores, ativistas e todos os trabalhadores da cultura. Nossa música, audiovisual, dança, teatro, artes plásticas, gastronomia, moda, design, arquitetura e artesanato compõem uma marca muito forte e reconhecida no mundo.
A cultura brasileira pode ser uma saída próspera, sustentável e democrática para a crise do país. E podemos fazer tudo isso em grande estilo, como fez Anitta no maior festival de música do mundo, o Coachella, misturando funk, samba, capoeira, verde-amarelo e a linda diversidade das juventudes brasileiras com a "Garota de Ipanema". ‘Bora’ juntar passinho batidão, sofrência popular, pisadinha irreverente e toada sertaneja com tropicalismo, roda de samba, feijoada e Carnaval para ajudar a salvar o Brasil.
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