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Masp em crise

Passando por uma grave crise financeira, Masp promove a mostra “Degas: O Universo de um Artista” para tentar resgatar o prestígio e visitantes ao museu.

 

ARTE CIDADANIA

29 de maio de 2006

NOTÍCIAS

Fonte: TEIXEIRA, C. Masp em crise. Arte Cidadania. 29/05/2006. Disponível em http://artecidadania.locaweb.com.br/site/paginas.php?setor=4&pid=1057. Acesso em 05/06/2006.


Masp em crise

por CARINA TEIXEIRA

 

O Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP), detém o maior patrimônio artístico da América Latina e é também um dos quatro museus no mundo inteiro que possuem a série completa de esculturas de bronze do impressionista francês Edgar Degas (1834-1917). Ao total são 73 peças, conjunto que existe também no Museu D’Orsay (Paris), no Metropolitan Museum (Nova York) e na Carlsberg Glyptotek (Copenhague, Dinamarca), mas que raramente são expostas ao público, pois normalmente estão alugadas para exposições no exterior, por causa das graves dificuldades financeiras da instituição.

Em 1997, ano comemorativo do cinqüentenário do museu,  a instituição promoveu a grande mostra de pinturas do francês Claude Monet (1840-1926), e desde lá não consegue atrair visitação expressiva. A média anual de visitação atual é de 180 mil visitantes, durante a exposição de  Monet atingiu a marca de 700 mil visitantes, recorde nunca mais alcançado.

Com a mostra “Degas: O Universo de um Artista”, o museu tenta recuperar esse público perdido, mas a maioria das atrações da exposição são exatamente aquelas que deveriam ser as mais corriqueiras: as esculturas do artista pertencentes ao acervo da instituição, além da tela a óleo “Quatro Bailarinas em Cena” e duas obras sobre papel (pastel e carvão). O grande sucesso da exposição é a disputada escultura “Pequena Bailarina de 14 Anos”, também do acervo do Masp, que o artista fez em 1880 em cera policromada e posteriormente foi fundida em bronze.

A última grande mostra de Degas no Masp: Degas em Movimento, foi realizada em 1998, pelo historiador Luiz Marques. Assim como nos eventos do cinqüentenário e também agora, a alternativa inteligente à falta de orçamento para trazer vários e bons trabalhos do exterior, que tem alto custo por causa de transporte e seguro, é completar a exposição com obras do museu. Recurso inteligente que além de divulgar o evento, também valoriza o acervo da instituição.

Essa fórmula também gera algumas misturas incompreensíveis a princípio, como no caso da mostra atual que acrescenta ao conjunto um retrato feito por Picasso, outro por Cézanne e também do artista brasileiro Rodolfo Amoedo (1857-1941), pertencente ao Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro. A explicação estaria no fato de que Picasso e Cézanne gostavam de pintar retratos, e Amoedo, assim como Degas, retratava a observação de cenas urbanas.

Seguindo essa mesma lógica, na exposição também estão outros quadros do acervo do museu dos artistas Ingres, Mantegna e Ticiano, que foram autores que serviram de referência a Degas, ainda como aprendiz de pintura.

A mostra tem curadoria de Eugênia Esmeraldo, que faz parte da antiga equipe técnica do museu. Ela trabalhou como assistente direta por mais de uma década de Pietro Maria Bardi (1900-1999), fundador e o mais prestigiado diretor do museu e Romaric Bruel, que trabalhou no consulado da França no Rio de Janeiro e foi chamado pelo atual diretor da instituição, o empresário do ramo imobiliário e arquiteto Júlio Neves, para ajudar o museu a atrair multidões.

Conhecido no circuito museológico, como um grande salvador para a falta de público em museus, o ex-diplomata francês Romaric Bruel, ganhou notoriedade quando em 1995, organizou uma mostra individual com obras do escultor francês Auguste Rodin para o Museu Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro e na Pinacoteca do Estado de São Paulo. Durante os 38 dias que a mostra esteve na Pinacoteca, e exposição gerou uma visitação de 150 mil pessoas. Um número expressivo para instituição, que soube com seu então diretor Emmanoel Araújo, capitalizar em patrocínios públicos e privados.

Já Júlio Neves, não teve a mesma rapidez mercadológica, quando em 2002, promoveu a exposição com excelente cunho apelativo, Pelé: A Arte do Rei. O que tinha uma previsão de atrair a venda de 600 mil ingressos, conseguiu apenas o número de 60 mil visitantes.  Agora com a exposição “Degas: O Universo de um Artista”, o diretor tenta mais uma vez, recuperar os números perdidos.

Ano de eleição

A previsão de eleições para o cargo de diretor do Masp está agendada para este ano, e não é uma simples coincidência que a mostra Degas: O Universo de um Artista”, seja feita em 2006. Como na última votação, há sempre uma mostra mais expressiva para representar os processos administrativos da instituição, mas com isso não debater a raiz da crise que assola o museu.

Em 2004, em ocasião das eleições passadas, a mostra em destaque foi “100 Maravilhas: Impressionismo e Referências”, que foi muito criticado por especialistas pela falta de cuidado na reunião das obras.

O atual diretor do Masp, Júlio Neves, empresário de 74 anos do ramo imobiliário e arquiteto, está há 12 anos na direção do museu, e sempre ganhou sem grandes disputas dos candidatos adversários. Desde que assumiu o cargo, aumentou o número de integrantes vitalícios de duas dezenas para os atuais 62, mesmo assim não tem concorrentes que queiram disputar o espinhoso fardo de administrar o museu, e nem que queira efetivamente ajudá-lo a melhorar as finanças da instituição.

Muito criticado por suas decisões administrativas, Júlio foi atacado, em 1998, por intelectuais de todo Estado ao autorizar uma reforma no Masp, que segundo especialista descaracterizaria o projeto arquitetônico original de Lina Bo Bardi. Em 2004, por conta de uma dívida ativa com o INSS de R$ 3 milhões, a instituição teve que penhorar uma de suas obras, avaliada em R$ 4,29 milhões.

Mesmo penhorando suas obras e não conseguindo pagar despesas básicas, o museu adquiriu em 2005, o prédio vizinho na Avenida Paulista por R$ 12 milhões, parcelando a dívida. Em 2007, deverá pagar a última parcela, de R$ 2,6 milhões.

Agravando ainda mais a situação do museu, no último dia 23 de maio, o prédio teve o fornecimento de energia elétrica cortado, por causa de uma dívida de R$ 3 milhões com a AES Eletropaulo, referente a atraso de sete anos no pagamento das contas. Além dos atrasos, a empresa acusa a instituição de fazer ligações irregulares de fevereiro de 2002 a março de 2004. O valor atualizado da energia desviada é de R$ 414 mil.

“O museu não pode ser tratado como um restaurante qualquer. É chocante. Todos nós temos um pouco de culpa, uns mais, outros menos”, desabafa Luiz Marques, conservador-chefe do Masp entre 1994 e 1997 e um dos maiores especialistas brasileiros de arte, em entrevista concedida ao Estado de S. Paulo

O acordo inicial com a Eletropaulo, foi que a instituição dividiria de dívida  em parcelas em 17 pagamentos de R$ 40 mil, dos quais dois foram feitos, e 35 de R$ 21 mil, mas só um foi quitado.

Desde o dia 26 de maio, o museu ainda não tinha entrado em acordo com a AES Eletropaulo, funcionando a base de geradores. A empresa afirma que a direção do Masp foi avisada do corte de fornecimento de energia em 5 de dezembro de 2005. No dia 22 de maio, Júlio Neves solicitou uma reunião com a concessionária, mas não compareceu. Depois desta data, Neves foi a outras duas reuniões na data do corte, sem apresentar uma proposta. 

Estima-se que as dívidas atuais do museu somadas ultrapassam R$ 10 milhões, o que põe em risco o precioso acervo da instituição que é avaliado em US$ 1,2 bilhão.

Degas: O Universo de um Artista”
Até dia 20 de agosto
Masp
Avenida Paulista, 1578 – Cerqueira César – São Paulo
Mais informações: (11) 3251.5644
Site Oficial: www.masp.art.br


Fonte: TEIXEIRA, C. Masp em crise. Arte Cidadania. 29/05/2006. Disponível em http://artecidadania.locaweb.com.br/site/paginas.php?setor=4&pid=1057. Acesso em 05/06/2006.