Governo exonera Lamartine Holanda, presidente da Funarte
Fonte: https://oglobo.globo.com/cultura/governo-exonera-lamartine-holanda-presidente-da-funarte-24951266
Coronel da reserva do Exército estava no cargo desde setembro, quando assumiu o lugar de Luciano Querido, ex-assessor de Carlos Bolsonaro
Em edição extra do Diário Oficial publicada na noite desta quarta-feira (31), o governo federal exonerou Lamartine Barbosa Holanda da presidência da Funarte (Fundação Nacional de Artes). O coronel da reserva do Exército estava no cargo desde setembro do ano passado, quando assumiu o lugar de Luciano Querido, ex-assessor do vereador Carlos Bolsonaro que ficou no comando da entidade por apenas quatro meses.
A saída de Lamartine foi assinada no D.O. por Sergio José Pereira, secretário-executivo da Casa Civil. O militar foi o sexto nome a comandar a Funarte no governo de Jair Bolsonaro, entre nomeados, interinos e substitutos. Além dele e de Querido, passaram pelo posto o ator Stepan Nercessian, que deixou a presidência da fundação em fevereiro de 2019. Em seu lugar entrou o pianista Miguel Proença, que por lá permaneceu até novembro do mesmo ano.
Na sequência veio o polêmico maestro Dante Mantovani, que ocupou a cadeira entre dezembro de 2019 e março de 2020, quando foi demitido pela então secretária de Cultura, Regina Duarte . Da sua saída até a chegada de Luciano Querido, em maio, quem tocou os trabalhos da Funarte foi o servidor Marcos Teixeira Campos, indicado por Regina.
O nome do próximo presidente da fundação ainda não foi anunciado pelo governo.
Mario Frias cita 'reestruturação'
Em nota publicada em seu perfil no Instagram, o secretário especial da Cultura, Mario Frias, cita uma "necessidade de reestruturação da Funarte", mas sem mencionar a exoneração de Lamartine Holanda.
"Na condição de secretário especial, sou o responsável pela supervisão ministerial das entidades vinculadas. Hoje chegamos à conclusão da necessidade de reestruturação da Funarte e iniciamos os trabalhos para que todos tenham acesso às políticas culturais de forma clara e objetiva. Este é o primeiro passo para mudanças necessárias em busca da popularização da cultura", diz o texto de Frias.
A Funarte, órgão responsável pelo fomento das diversas manifestações artísticas, foi um dos que mais recebeu nomeações controversas em 2020. Após ter sido indicada em abril como coordenadora do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a turismóloga e blogueira Monique Aguiar teve a nomeação suspensa pelo então ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, em 16 de junho. Dois meses depois, Monique foi nomeada coordenadora de Projetos Especiais da Diretoria-Executiva da Funarte.
Desde 14 de setembro, a Funarte era dirigida por Lamartine Barbosa Holanda, coronel da reserva do Exército, que substituiu Luciano Querido, ex-assessor de Carlos Bolsonaro na Câmara de Vereadores do Rio. Em seu currículo, Holanda destacou cursos de roteirista na Escola de Cinema de São Paulo e de gestão de direitos do processo de financiamento de projetos audiovisuais com recursos públicos.
Em 2019, o coronel participou de um vídeo feito pelo deputado estadual Castello Branco (PSL), na Cinemateca Brasileira, para anunciar um festival de cinema militar que acabou não acontecendo. Outro coronel do Exército, Álvaro Roberto Cruz Ferreira Lima, foi nomeado em 8 de outubro para o Centro de Programas Integrados da fundação, responsável por preservar e difundir o acervo de 400 mil itens.
A situação atual da Funarte, aliás, não é nada animadora. Das entidades vinculadas à Secretaria Especial da Cultura, comandada por Mario Frias, ela é a que tem mais projetos aguardando parecer técnico para encaminhamento à Comissão Nacional de Incentivo à Cultura, a CNIC: são 1,2 mil no total.
Repercussão
A alta rotatividade de nomes à frente da Funarte é apenas um entre tantos outros alvos de críticas à política cultural do governo, assim como a extinção do ministério da Cultura, os entraves de projetos audiovisuais na Ancine e a precariedade na ajuda aos profissionais do setor durante a pandemia.
Para a cantora Teresa Cristina, as turbulências na Funarte, especificamente, mexem com suas memórias afetivas.
— O desmonte que esse governo faz com a cultura é muito triste. Dói muito na gente ver a Funarte nesse estado — lamenta a sambista. — Já fiz tanta coisa ali no prédio da fundação, na Rua da Imprensa, na Cinelândia. Foi ali que realizei shows com Xangô da Mangueira, Tantinho, Jurandir, Monarco, Roque Ferreira, Argemiro, Seu Jair, Surica.
Para Fabio Szwarcwald, diretor executivo do Museu de Arte Moderna do Rio (MAM), é necessário, antes de tudo, ocupar a presidência de uma instituição como a Funarte com um quadro técnico e experiente.
— Essa grande quantidade de nomeações em dois anos se tornam um indicador grave de descontinuidade de projetos. Essa função deve ser ocupada por alguém do setor cultural, com ampla trajetória de gestão e boa capacidade de diálogo com a classe artística — analisa Szwarcwald. — A Funarte é um órgão estratégico para a promoção e difusão da cultura brasileira, que corresponde a 4% do PIB nacional.
Fundador e presidente da APTR (Associação de Produtores Teatrais do Rio), o produtor Eduardo Barata vai ainda mais a fundo em sua análise da situação da Funarte. Ele acusa o atual governo de comandar um "projeto maior" cujo objetivo é "aniquilar" a economia do setor cultural.
— Enquanto não mudar o presidente do país, nada muda, só piora. É que nem o ministério da Saúde. O que temos são marionetes que, no caso da Funarte, cumprem ordens para piorar a operacionalização da Lei Rouanet — diz Barata. — A questão é perseguir quem se coloca contra a opinião deles e as pessoas que eles acham que são comunistas, petistas, etc. Então, pode botar a pessoa que for. Tira um general, bota um capitão, tanto faz.
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