Fachin diz que relatos sobre mudanças na Lei Rouanet são 'de extrema gravidade' e intima governo Bolsonaro
BRASÍLIA — O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), classificou como sendo de "extrema gravidade" os relatos feitos pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) a respeito de um decreto de julho e seis portarias do Executivo relativas à Lei Rouanet, e intimou a prestarem informações o presidente Jair Bolsonaro, o ministro do Turismo, Gilson Machado, o secretário nacional de Cultura, Mário Frias, e o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo.
A intimação foi feita pelo ministro nesta quinta-feira em uma ação apresentada à Corte pela OAB para anular as medidas adotadas pelo governo federal. Segundo a entidade, as normas foram publicadas em um contexto de "violações em série" no processo de seleção e aprovação de projetos propostos de acordo com a Lei 8.313/1991, de incentivo à cultura, mais conhecida como Lei Rouanet.
"As alegações aduzidas na petição inicial são de extrema gravidade. Em substância, elas combinam elementos que formam a razão de ser do próprio controle de constitucionalidade, a saber, a proteção contra perseguições políticas, contra a censura e contra o desmonte institucional dos aparatos institucionais do Estado", disse Fachin em despacho.
O ministro lembrou que as alegações ocorrem no contexto dos direitos culturais, garantidos em tratados internacionais e pela Constituição. E que "eventuais violações sistemáticas de direitos fundamentais na seara das políticas de cultura" merecerão a atenção do Supremo.
"Os relatos trazidos à colação, ao referirem atos e omissões ocorridos no bojo das políticas públicas de mecenato, da Secretaria Especial de Cultura e da Fundação Palmares expõem uma série de litígios que transcendem as esferas individuais dos cidadãos, e guardam relação com o modo como opera a institucionalidade do Estado", afirmou.
Por se tratar, na avaliação do ministro, de um processo estrutural, "o qual necessariamente conduz a soluções complexas", é necessário ouvir as autoridades estatais. Por isso, solicitou as informações também ao Secretário Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura, André Porciúncula.
Segundo a OAB, durante o goberno Bolsonaro ocorreu a "desestruturação da única instância paritária de análise e seleção de projetos, a Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC), justamente o locus de participação da sociedade civil", havendo "inexplicável concentração dos poderes nas mãos de um único agente do Estado" e "redução drástica" do volume de projetos aprovados.
Em 22 de abril, 17 dos 21 integrantes da antiga comissão, cujo mandato bienal havia chegado oficialmente ao fim no mês anterior, enviaram uma carta ao secretário especial da Cultura, Mario Frias, pedindo que o edital para selecionar os novos membros para a composição do biênio 2021/2022 fosse "lançado o mais rápido possível". Desde então, todas as decisões sobre os projetos inscritos na Rouanet ficaram concentrados no secretário de Fomento e Incentivo à Cultura, André Porciuncula, que passou a aprová-los (ou não) ad referendum, isto é, sem a participação do colegiado.