As incertezas povoam a 32ª Bienal de São Paulo
O grito de Frans Krajcberg na defesa das florestas ecoa entre as 340 obras que povoam a 32ª Bienal de São Paulo. Aos 95 anos, o artista plástico polonês, que está no Brasil desde 1950, fez uma exigência. Participaria sim, mas desde que o evento saísse na defesa das florestas, do território indígena e da vida do planeta.
Com a sua luta, Krajcberg está à frente. Os visitantes entram e já se deparam com as esculturas feitas de troncos, cipós e raízes. O artista criou uma floresta com as árvores que foram derrubadas. E as colocou de pé outra vez. Os troncos que pintou de vermelho, de preto, sugerem uma dança ou ritual indígena. “Onde está a arte?”, questiona. “É importante mostrar a barbárie contra o planeta. Lutar e alertar sobre a salvação da Amazônia.”
“Krajcberg é o tema central da mostra”, observa Julia Rebouças, pesquisadora e crítica de arte que integra a equipe de curadores. “Ele defende que não faz sentido separar a ecologia das questões políticas e culturais.”
Os guerreiros feitos de árvores mortas estão no térreo dialogando com as árvores do parque e com as instalações no interior do edifício. Uma conversa que atrai os visitantes para a oca criada por Bené Fonteles, paraense que vive em Brasília. Teto de palha, paredes de taipa acolhem a arte dos indígenas. Como Krajcberg, utiliza restos de materiais orgânicos que são trazidos pelo mar. Compõe um altar que reúne estatuetas lembrando as crenças populares com suas celebrações e oferendas. A instalação Ágora: OcaTaperaTerreiro transporta o espectador para o interior da floresta.
Enquanto no mundo de Fonteles habitam sonhos e crenças, a paisagem da peruana Rita Ponce de Léon traz um planeta desconhecido, a ser explorado. Um mundo que, como o título Na forma de nós mesmos, sugere uma busca por algo que está começando ou terminando. O visitante pode acomodar o rosto, os braços, as pernas nas cavidades de barro, desestabilizando ou descobrindo o próprio corpo.
Uma nova dimensão
Sob o olhar da arte, o drama tanto da devastação das florestas, da destruição dos rios como da desumanidade urbana das metrópoles ganha uma nova dimensão. Muda o foco do olhar acomodado no cotidiano. O coletivo Vídeo nas Aldeias, integrado por Ana Carvalho, Tita e Vincent Carelli, apresenta as imagens, gestos, cantos e línguas dos Xavante, Guarani, Kaiowá, Krahô, Yanomani e Kayapó, entre outros povos. E provoca uma reflexão sobre a luta dos índios em preservar a sua cultura e defender suas terras.
Com a instalação Transnômades, o coletivo Opavivará traz questões urbanas que acabam se diluindo no dia a dia. Mostra os carrinhos movidos por tração humana que estão pela cidade e os ressignifica ao transformá-los em cama, carro de som, biblioteca. O objetivo é questionar sobre a situação dos carroceiros, nômades que estão pela cidade no constante improviso para sobreviver.
O protesto à violência contra as crianças e jovens negros de diversas comunidades em Kingston, na Jamaica, é a referência para a obra de Ebony G. Patterson. A artista transita por técnicas variadas e transforma as imagens em painéis de grande dimensão.
Pela primeira vez na história das Bienais, as obras têm uma proposta comum. Não chamam a atenção para o artista, mas para a expressão coletiva de impedir a destruição do planeta. O tema Incerteza Viva traz um mundo de incertezas que reflete sobre a crise ambiental e a crise dos valores humanos. O curador da 32ª Bienal de São Paulo, Jochen Volz, observou: “Michel Temer garantiu, em seu discurso de posse, que as incertezas acabaram. Mas aqui as incertezas continuam. Nossa meta é refletir sobre as atuais condições de vida e também sobre as estratégias da arte para enfrentar as questões do nosso tempo, como o aquecimento global e a crise mundial”, observou. “Hoje, é papel da Bienal ser uma plataforma que promove ativamente a diversidade, a liberdade e a experimentação, ao mesmo tempo exercendo o pensamento crítico e propondo outras realidades possíveis.”