Você está aqui: Página Inicial / Sobre / O espaço do livro

O espaço do livro

Texto de apresentação do livro "Museu Arte Hoje" organizado por Martin Grossmann e Gilberto Mariotti

 

Existem pelo menos duas referências básicas hoje, quando é necessário discutir as instituições museológicas: o ensaio fundamental de Adorno, “Museu Valery Proust” e o não menos importante “Museu Imaginário”, de Malraux. Ambos narram a ocorrência de descontextualizações que tornam novos significados disponíveis para a percepção e o pensamento. Adorno toma como um de seus objetos o relato incomodado de Valéry sobre a reconfiguração da experiência no museu de arte que implica da interdição ao uso da bengala ao caminhar por entre as obras, dispostas agora de forma a se apresentarem sem mistérios ao visitante. Malraux aponta novas possibilidades de leitura abertas pelo olhar fotográfico, a partir da pretensão do fotógrafo à simples reprodução das obras do museu.

No caso desta seleção de artigos, entrevistas e transcrições, a leitura também nasce de uma descontextualização. O espaço virtual do site do Fórum Permanente, em que os textos aqui reunidos antes conversavam, nos oferecia passagens que realizam relações em constante reedição e realinhamento dos conteúdos, que sequer correspondem mais à integra de cada texto.

Algo similar ocorre com a proposição original de Lina Bo Bardi para o Museu de Arte, o MASP – hoje desconfigurada, o que garante a pertinência da escolha de “Uma ideia de museu”, texto de Marcelo Ferraz como ponto de partida deste livro. Marco original internacional localizado na periferia do eurocentrismo, como tantas outras manifestações consideradas extemporâneas, hoje revalorizadas e inseridas em uma história possível, a arquitetura e a expografia radical deste museu sugerem a contextualização dialógica do equipamento cultural na cidade e o emponderamento do visitante como estratégias possíveis para uma atuação sociabilizada do museu. Não de forma mandatória, mas como anseio.

No tempo presente ativamos uma consulta com Jean Galard, Marcelo Araújo, Paulo Sérgio Duarte, Fernando Cocchiarale, importantes interlocutores do sistema da arte brasileira: o que eles pensam sobre o museu de arte hoje no Brasil, da possibilidadede imaginar um Museu Ideal e do que é possível concretizar. E como complemento, transcrevemos um encontro histórico em setembro de 2004 onde foram muito bem expostos alguns Desafios para Museus de Arte no Brasil no Século XXI: Uma mesa redonda formada por Paulo Herkenhoff, Moacir dos Anjos, Paulo Sérgio Duarte e Marcelo Araujo, representando o Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro, o Museu de Arte Moderna do Recife, a Fundação Iberê Camargo em Porto Alegre e a Pinacoteca do Estado em São Paulo.

Na sequência, dois textos que relacionam o fazer artístico com os museus de modo distinto, um pelo viés de um pensamento arquitetônico contemporâneo, “As arquiteturas de museus contemporâneos como agentes no sistema da arte” de David Moreno Sperling e outro, “Perspectivas para o museu no século XXI” de Ricardo Basbaum, pelo papel do artista como agente. Por fim um texto que propõe a discussão do Museu como Interface, incorporando estratégias do anti-museu, bem como de outras práticas culturais, sejam institucionais, como as dos centros culturais, sejam experimentais como as dos museuslaboratórios dos anos 1960 e 1970, além de propostas que ativam ações na virtualidade.

Concretiza-se uma configuração a que aparecem submetidos aqui estes textos. Nem por isso deve representar perda em relação às possibilidades de interpretação. Cabe ao leitor abrir caminho por entre os momentos diversos contidos nos textos, rearticulando as passagens pela linha de edição e pelo espaço do livro, algo semelhante ao que se espera de uma experiência no museu.

Gilberto Mariotti e Martin Grossmann