Prefácio
E onde é que se juntam o passado, o futuro e o presente
Onde o samba é permanente? Na Mangueira, minha gente.
(Rildo Hora, Meninos da Mangueira)
Os primeiros contatos com pesquisadores da obra de Hélio Oiticica para a construção de uma coletânea de textos foram feitos com a proposta de juntar trabalhos que expandissem a pesquisa sobre Hélio Oiticica para além do caminho Neo-concretismo --> Mangueira, que prioriza o trabalho de Oiticica da década de 1960. Textos pouco estudados da década de 1970 nunca estiveram tão facilmente acessíveis quanto agora, graças ao trabalho diligente do Projeto HO e da equipe coordenada por Lisette Lagnado no Itaú Cultural que, entre 1999 e 2002, construiu um banco de dados on-line com 5.000 páginas escritas pelo artista, o “Programa HO” freqüentemente citado nos artigos dessa coletânea. Estes e os demais escritos de Oiticica (cerca de 15.000 páginas no total), bem como imagens das obras e textos de comentadores, foram organizados em formato digital pela equipe do Projeto HO em conjuntos de CDs disponíveis para pesquisadores.
Pode-se agora percorrer o labirinto esticando o novelo que cada um escolhe a partir desse universo de anotações de Oiticica, entrevistas, referências que o artista fazia a outros pensadores, cartas, fotografias... A difusão dos manuscritos segue aquilo que mais sobressai na produção de Oiticica: convite à participação, ao movimento, e assim à inevitável e imprevisível “multiplicação celular”.
A coletânea “Seguindo Fios Soltos” advém dessa imprevisibilidade e multiplicação. Correndo o risco de mimetizar demais as estratégias do artista, digo que esse agrupamento de pesquisas formou um Barracão virtual, shelter para o desenvolvimento de textos inéditos, para a apreciação de artigos que já haviam sido publicados e precisavam ser relidos, ambiente para a troca de imagens, de manuscritos e arquivos de som com sambinhas, como Meninos da Mangueira, que abre esse texto. Retornamos então a uma Mangueira trans-formada, com samba e com rock, que junta o arcaico e o conceitualismo, mistura de corpo, arquitetura, música e cinema.
O momento da proposta dessa compilação não poderia ser mais propício para a junção de partes que estavam espalhadas: o catalogue raisonné e uma grande exposição sobre a obra de Oiticica estão sendo organizados em Houston sob supervisão do Projeto HO e a 27a Bienal de S. Paulo alicerça-se em conceitos desenvolvidos por Hélio Oiticica, em especial o bloco, parte que justaposta a outras forma um novo bloco.
O bloco não exige de você uma performance especial como sambista, exige de você uma vontade de se juntar no fenômeno, coletivo, essa que é a única exigência que o bloco faz [...] (Hélio Oiticica e Carlos Vergara, “Rap in Progress”, Héliotapes)
Integraram o bloco de forma determinante para essa publicação o incentivo de Durval de Lara Filho à idéia inicial de se fazer uma coletânea de artigos sobre Hélio Oiticica, o apoio de Martin Grossmann, das equipes do Fórum Permanente e do Projeto HO, o entusiasmo de Beatriz Scigliano Carneiro, Suzana Vaz e Michael Asbury, e o acolhimento e orientação que recebi de Celso Favaretto. A coletânea tomou forma graças a todos os autores que aderiram à idéia e responderam prontamente ao convite ao samba. Que o bloco continue a crescer!
Paula Braga – setembro/2006 [ 1]
1 A organização dessa coletânea é parte de uma pesquisa financiada pelo CNPq, processo 140923/2003-9