Live Art. O que é Live Art? - por Lois Keidan
Live Art não deveria ser entendida como a descrição de uma forma de arte, mas sim, como uma estratégia de inclusão de uma diversidade de práticas e artistas que, em outras circunstâncias, se encontrariam “excluídos” de todos os tipos de política e de apoio e de toda espécie de trabalho de curadoria ou de debate crítico.
Usar o termo Live Art não é tentar definir ou estabelecer uma prática, mas, sim, uma estratégia que abre uma nova paisagem, mapeia novas geografias artísticas, imagina novas formas de trabalho e, ao mesmo tempo, cria apropriadas estruturas culturais, críticas e de curadoria em torno desse campo eclético e expansivo de práticas e artistas.
Live Art é, portanto, o termo para um esquema de modelagem, uma forma de abordagem, acomodação e liberdade de uso de novas formas de trabalho, as quais nem sempre se ajustam às estruturas existentes e às configurações e fronteiras rígidas das áreas reconhecidas de expressão artística.
A natureza exploratória da Live Art pode levar à idéia de que se trata de uma área “emergente”, mas isso falseia sua história e sua origem. A Live Art evoluiu a partir das práticas da Arte Performática que radicalizou os espaços de galerias nos últimos anos do século XX, quando, em desafio às políticas sociais e culturais e como rejeição tanto a objetos como a mercados, artistas visuais passaram a apresentar o corpo como seu material e campo de trabalho, e aos conceitos de presença, processo e lugar. Tais transgressões à estética e às convenções das Belas Artes alimentaram e foram, por sua vez, alimentadas por artistas trabalhando nas fronteiras de várias culturas performativas e de performance, bem como pelos praticantes radicais nos domínios da teoria, do comentário e do ativismo cultural.
Desde o final do século XX, uma nova geração de artistas vem desenvolvendo todos os tipos de práticas ao vivo a partir das metodologias explosivas da Arte Performática, mas configuradas pelas realidades do agora.. Trabalhando com meios, contextos e espaços, esses artistas inauguraram, de um jeito impactante, excitante e urgente, novos modelos de criação, novas linguagens para a representação de idéias e identidades, novas formas de mobilizar platéias e novas estratégias de intervenção na esfera do público. Lançaram mão, como diz Adrian Heathfield, da performance como uma força geradora para destruir falsas aparências, romper tradições de representação e trazer novas e diferentes formas de engajamento com o significado.
Ao investigar e testar o permissível e o possível em arte, Live Art gerou aquilo que Joshua Sofaer se referiu como uma explosão da estética convencional e dos conceitos reconhecidos de interdisciplinaridade, hibridez e convergência. Seja desafiando as ortodoxias da prática das Belas Artes, seja explorando os limites da teatralidade, apropriando-se das expressões da cultura de massas, avançando as fronteiras das convenções coreográficas, ocupando a linha de frente do ativismo político ou explorando a performatividade dos espaços virtuais, as práticas da Live Art se apropriam de todos os tipos de meios em um estado volátil. Indo do proibido ao escondido, das demonstrações às apresentações, do doméstico às galerias da Tate Modern, Live Art se envolve ativamente numa pluralidade de contextos culturais e discursos críticos. Live Art é um corpo em expansão de abordagens que oferecem ao público experiências de imersão, envolvendo-o como parceiro cúmplice no fazer e na leitura do significado. Em meio à simultaneidade e interatividade de uma cultura saturada de mídia, Live Art investe em questões do imediato e da realidade, criando espaços para explorar a experimentação das coisas, as ambigüidades do significado e as responsabilidades de cada um como agente. As práticas da Live Art construíram novas estratégias de expressão de identidades, para além das antigas distinções de etnicidade, gênero e sexualidade, nas quais tornam-se visíveis o desprovido e o desincorporado e nas quais contesta-se a política da diferença e a complexidade é confrontada.>
Ao romper as fronteiras e as regras, ao desafiar tradições, ao resistir ao que está definido, ao questionar, mobilizar platéias e expor as lacunas, Live Art apresenta maneiras diferentes de encarar a natureza e a experiência da arte e transforma-se, conseqüentemente, em um das mais potentes e provocativas arenas da cultura contemporânea.
A Live Art consegue mover-se com fluidez entre contextos e estruturas, ocupar todos os tipos de espaços e dirigir-se a qualquer platéia. Pode-se inserir sutilmente em meio ao público como uma intervenção, ocupar um lugar fixo em uma galeria, posicionar-se em uma programação de teatro ou assumir um domínio no ciberespaço.
Assim, enquanto abordagem, a Live Art opera tanto dentro, como na margem, de uma gama de áreas de expressão artística e discursos. Mas dizer que a Live Art situa-se na margem não é sugerir, de modo algum, que seja marginal, mas sim, que testa e percorre limites e fronteiras através e entre áreas disciplinares e concepções.
A Live Art é, hoje em dia, amplamente reconhecida como um dos espaços de criação mais vitais e influentes, com evidente impacto sobre a cultura do “mainstream”. A Live Art é o motor da pesquisa de nossa cultura, criando e ampliando novos espaços para investigações artísticas e forçando-nos a reconsiderar o que é uma platéia e como nos envolvemos com ela.
Promovendo a Live Art
Live Art já é amplamente reconhecida como um campo vibrante e desafiador de prática, tanto em Londres como no resto da Grã-Bretanha. Reflete genuinamente as mudanças que vêm tendo lugar através e entre as artes visuais, performáticas, o teatro, a dança, a nova escrita, a mídia digital e a imagem em movimento e compreende a evolução e a sofisticação das experiências e expectativas de artistas e do público neste tempo de final de um milênio e início de outro.
Durante os anos 90, o impacto dos artistas que trabalhavam na arena da Live Art expandiu-se pelo mundo artístico da capital inglesa e além, dando forma a estruturas críticas, infra-estruturas culturais e à política de produção e consumo de artes. Eles trouxeram ao primeiro plano conceitos de interdisciplinaridade e colaboração, deslocaram os pontos de referência da arte contemporânea e, em sua resposta à hibridez e complexidade das forças em jogo no mundo moderno, contribuíram ativamente para definir de forma mais ampla os debates culturais e sociais.
Live Art provou que, enquanto campo de prática, consegue não apenas desafiar a natureza e a experiência da arte contemporânea, mas também romper com os modos aceitos de leitura do mundo. Mais importante ainda, Live Art levanta questões sobre justamente quem está produzindo arte, para quem e como.
No entanto, sem caminhos definidos ou letreiros para serem seguidos, os processos exploratórios e as amplas bases disciplinares da Live Art sugerem serem necessárias formas alternativas de apoio. Idéias convencionais de treinamento, colocação do produto e marketing não proveêm todas as respostas às indagações quanto ao apoio que os artistas devem receber em seu desenvolvimento artístico e profissional, quando engajados numa área necessariamente diversificada e fragmentada e na qual os conceitos de processo são não apenas críticos, mas inerentes.
Sob pressão para produzir novas obras e simplesmente sobreviver no mercado cultural, a muitos artistas da Live Art têm sido negadas oportunidades de pleno desenvolvimento de suas idéias e práticas ou de auto-determinação de seu papel e representação.As estruturas e estratégias existentes de apoio às artes não dão necessariamente conta das necessidades de desenvolvimento e de status desse setor em contínua evolução. As idéias, processos e práticas exploratórias da Live Art demandam tratamentos alternativos ao que existe em arte, artistas, público e crítica na capital.
Por tal razão é que foi criada a Live Art Development Agency.
Live Culture na Tate Modern
“A Live Culture dá ao público a chance de experimentar novas formas de engajamento artístico e também permite à Tate Modern avaliar o seu papel, não apenas como espaço de preservação e interpretação, mas também como geradora ativa de obras de performance.” (Sir Nicholas Serota, Diretor da Tate)
Como parte do compromisso da Tate de apoiar as variadas formas de prática artística contemporânea, a Tate Modern colaborou com a Live Art Development Agency no mostra Live Culture, que teve lugar entre 27 e 30 de março de 2003. Esta iniciativa alçou, pela primeira vez, a performance contemporânea à categoria de exibição de coleção da galeria.
A Live Culture forneceu uma oportunidade de envolvimento com a natureza cambiante da prática da Live Art em relação às artes visuais, ao reunir artistas, teóricos e curadores renomados para debater e avaliar a expansão da arte de performance por campos artísticos e sociais mais amplos e seu papel na mudança cultural.
O ressurgimento do interesse em práticas experimentais e performáticas no âmbito das artes visuais e a condição de algo vivo como objeto e valor principal, em meio ao ambiente atulhado de mídia da cultura contemporânea, fizeram da Live Culture uma intervenção oportuna e crítica em relação aos discursos correntes. Live Culture foi uma referência para avaliar mudanças-chaves ocorridas na arte performática nas últimas décadas: seu desdobramento para fora do espaço de galeria, rumo a outros espaços e formas; sua natureza cada vez mais híbrida e o rompimento das fronteiras globais e culturais; seu uso do arriscado e do extremo no confronto da arte e da política do corpo; sua influência no ativismo social e na atuação política; sua interface com o mundo digital e seu papel enquanto espaço para expressões de novas identidades para além das distinções de etnicidade, gênero e sexualidade.
Com Live Culture iluminaram-se os caminhos pelos quais o termo Live Art passou a representar um conjunto de práticas contemporâneas que empregam a performance como sua força geradora para destruir falsas aparências, desfazer tradições de representação e abrir alternativas de engajamento com o significado.
Lois Keidan
Lois Keidan é o co-fundadora e diretora da Live Art Development Agency, a principal organização de desenvolvimento da Live Art no Reino Unido. Criada em 1999, a Live Art Development Agency dá informações práticas e orientação, oferece oportunidades para pesquisa, treinamento, diálogo e debate, trabalha em parceria com os artistas e organizações em iniciativas de curadoria e desenvolve novos meios para tornar a Live Art mais apreciada por parte do público e da crítica.
De 1992 a 1997 ela foi diretora de Live Arts no Institute of Contemporary Arts, em Londres, responsável pela programação anual dedicada ao apoio e à representação de novos artistas, novas concepções e novas práticas, tanto do Reino Unido como de todo o mundo. Antes, ela fora responsável pela política nacional e apoio à arte performática e a práticas interdisciplinares no Conselho de Artes da Inglaterra.
Lois Keidan tem escrito artigos sobre Live Art para uma série de revistas e publicações e realiza palestras e apresentações em festivais, universidades, eventos e conferências, tanto no Reino Unido como internacionalmente.
Para maiores informações sobre a Live Art Development Agency, visite o site www.thisisliveart.co.uk
Informações Adicionais
Artistas
Veja este site para links com artistas individuais: www.thisisliveart.co.uk
Entidades
http://www.tate.org.uk/modern/exhibitions/liveculture/
As seguintes entidades são membros fundadores da Live Art UK (www.liveartuk.org):
Arnolfini
www.arnolfini.org.uk
Artsadmin – Artists’ Advisory Service
www.artsadmin.co.uk
Bluecoat
www.bluecoatartscentre.com
Chapter Arts Centre
www.chapter.org
Colchester Arts Centre
www.colchesterartscentre.com
Fierce Earth
www.fierce.info
green room
www.greenroomarts.org
New Moves International
www.newmoves.co.uk
New Work Network
www.newworknetwork.org.uk
Tramway
www.tramway.org
Texto disponibilizado pela Live Art Development Agency