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Entenda crise no Masp, de veto a evento de Boulos e fotos do MST a demissões

Sandra Benites, primeira curadora indígena do museu, pediu demissão após o caso; museu nega que seja ato de censura

 

Imagem 1 demissão curadora indígena detalhes

Imagem 1 demissão curadora indígena detalhes

 

Por Folha de S. Paulo https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2022/05/entenda-crise-no-masp-de-veto-a-evento-de-boulos-e-fotos-do-mst-a-demissoes.shtml

 

Carolina Moraes

João Perassolo

O Masp, principal museu do país, enfrenta uma crise após o cancelamento de um evento de lançamento de livro do Guilherme Boulos, do PSOL, e depois da decisão de duas curadoras de cancelarem um núcleo da maior mostra do ano na instituição, "Histórias Brasileiras".

 

Foi no começo deste mês que Sandra Benites, curadora-adjunta que acaba de pedir demissão após o caso, e Clarissa Diniz, curadora convidada da instituição, informaram que cancelariam o núcleo denominado "Retomadas". O motivo, segundo elas, foi um veto do museu a um conjunto de fotos do MST que constituiria o cerne deste núcleo.

 

O museu afirma ter recebido a relação desse material da curadoria com pouco menos de três meses de antecedência da abertura da mostra, prevista para julho, o que extrapola os prazos para a execução de procedimentos como a solicitação do empréstimo das fotos e a cessão do uso de imagens. Também nega que a ação seja censura de conteúdo.

 

Entenda a crise no MASP

1 Por que o núcleo 'Retomadas' da mostra 'Histórias Brasileiras' foi cancelado?

2 O que diz o Masp sobre isso?

3 Qual foi a reação do meio artístico?

4 O que houve em relação ao evento com Guilherme Boulos?

5 Do que se trata essa mostra?

6 Por que a curadora Sandra Benites pediu demissão?

7 Houve outras demissões recentes no museu?

 

Já as curadoras afirmam que não foram informadas sobre essa data máxima definida pela instituição. Num email enviado aos artistas comunicando o cancelamento do núcleo, elas disseram que "apesar do cuidadoso trabalho realizado, para a nossa surpresa, o Masp não concordou com a integral inclusão da representação das 'Retomadas' pelo suposto descumprimento de um prazo que não nos foi informado pela produção ou pela curadoria do museu".

 

"Impedidas de levar adiante nosso acordo com o Movimento Sem Terra, seus fotógrafos e Edgar Kanaykõ como sanção a um erro que sabemos não ter cometido, nos sentimos desrespeitadas, injustiçadas e instadas, em consequência de tal decisão, a trair a confiança deste que não é só o maior movimento social do Brasil, como também é a coluna vertebral do 'Retomadas'", justificaram elas no mesmo email.

 

Em meio a essas controvérsias, houve ainda a saída de pelo menos duas pessoas da produção, um envolvido no acervo da instituição e do curador-chefe, Tomás Toledo, ainda que nenhum dos pedidos de demissão estejam relacionados com os dois episódios recentes.

 

Por que o Núcleo "Retomadas" da mostra "Histórias brasileiras foi cancelado

As duas curadoras que organizavam o núcleo decidiram cancelar o projeto no começo deste mês após o Masp não aprovar o uso de seis fotografias do MST e de movimentos indígenas.

 

No email enviado aos artistas que integravam o "Retomadas", elas já haviam afirmado que o museu alegou que o conjunto não poderia integrar a mostra porque foi requisitado após o prazo estipulado pelo museu para o empréstimo das obras. Elas afirmam, no entanto, que não foram informadas dessa data máxima definida pela instituição, o que o museu nega.

Imagem 1 curadora indígena Masp

A curadora e antropóloga Sandra Benites - Mathilde Missioneiro - 12.dez.2019/Folhapress

 

Num posicionamento público após a publicação da primeira reportagem sobre o caso, elas detalharam que o cronograma de "Histórias Brasileiras" como um todo estava atrasado havia meses e que, preocupadas com o atraso da instituição de formalizar os empréstimos, chegaram a pedir reunião com a produção.

Elas ainda argumentaram que o conjunto de imagens era central para o argumento da exposição, e por isso resolveram cancelar o núcleo como um todo.

 

"Impedidas de levar adiante nosso acordo com o Movimento Sem Terra, seus fotógrafos e Edgar Kanaykõ como sanção a um erro que sabemos não ter cometido, nos sentimos desrespeitadas, injustiçadas e instadas, em consequência de tal decisão, a trair a confiança deste que não é só o maior movimento social do Brasil, como também é a coluna vertebral do 'Retomadas'", justificaram ainda no email.

 

O que diz o MASP sobre isso

A instituição disse em nota que recebeu a relação desse material com pouco menos de três meses de antecedência da abertura da mostra, o que extrapola os prazos para a execução de procedimentos como a solicitação do empréstimo das obras e a cessão do uso de imagens.

 

O padrão do Masp é de quatro a seis meses, e essa informação constava no contrato das curadoras, dizem representantes do museu, acrescentando ainda que o prazo foi reiterado a elas numa reunião.

 

"No entanto, o museu conseguiu atender sim um dos pedidos das curadoras, de maneira excepcional, para incluir as obras pertencentes ao acervo do Movimento Sem Terra, um total de sete cartazes e documentos. O que não foi possível incluir foram seis fotografias de três fotógrafos. Embora esse material representasse o eixo central do núcleo, ele foi entregue ao museu fora do prazo", acrescenta a instituição.

Eles ainda afirmaram que outras obras da instituição também chegaram a não ser aprovadas por terem extrapolado o prazo.

 

"Não se trata então de uma restrição em termos de conteúdo, mas sim única e exclusivamente de cronograma institucional", afirma o museu, que também nega relação do evento com o cancelamento do lançamento de livro de Guilherme Boulos.

 

Qual foi a reação do meio artístico

A postagem mais recente de Clarissa Diniz no Instagram respondendo ao posicionamento do Masp recebeu apoio de importantes curadores e artistas nos comentários, a exemplo de Douglas de Freitas, Hélio Menezes, Fernanda Pitta, Jonathas de Andrade e Gustavo Von Ha.

 

O que houve em relação ao evento com Guilherme Boulos

O lançamento do livro "Sem Medo do Futuro", de Guilherme Boulos, do PSOL, que aconteceria também no Masp, foi cancelado pela instituição também no começo do mês.

 

Na ocasião, o museu disse ao UOL, que revelou o caso, que o evento não estava de acordo com as suas diretrizes, que proíbe manifestações políticas. "O lançamento precisou ser cancelado por não estar de acordo com o Artigo 2, Parágrafo Terceiro do estatuto social do Masp, que expressa a 'vedação à realização de quaisquer manifestações de caráter político e/ou religioso', impossibilitando que o museu atue como sede de qualquer tipo de evento relacionado a esses temas", disse.

 

​A editora do livro, a Contracorrente, ainda assim lembrou que a equipe já havia feito visitas técnicas, assinado a minuta contratual e até mesmo iniciado a divulgação do lançamento.

 

Do que se trata essa mostra

"Histórias Brasileiras" é a maior mostra do Masp deste ano e ocupará dois andares do museu com suas mais de 300 obras. A exposição conta com 12 curadores. O museu afirma que, dada a dimensão da mostra, é necessário mais rigidez e disciplina com relação a todas as instâncias e que os organizadores de todos os núcleos da mostra estavam cientes disso. Diz ainda que outros curadores também tiveram de cancelar empréstimos. ​

 

Por que a curadora Sandra Benites pediu demissão

Sandra Benites pediu demissão do Masp após o museu vetar um conjunto fotografias do Movimento Sem Terra e, como justificativa, reforçou um descontentamento geral com a posição que ocupava, já que não se sentia convidada a integrar projetos curatoriais do espaço. "Histórias Brasileiras" seria o primeiro projeto assinado por ela após dois anos no cargo de curadora-adjunta.

 

Além disso, ela disse à instituição que sua presença no Masp parecia estar mais a serviço de uma imagem de um museu diverso do que por um interesse em seu trabalho propriamente. Benites considerou desrespeitosa a maneira com que ela e Clarissa Diniz foram tratadas na produção de "Histórias Brasileiras".

À Folha, a curadora afirma que ainda não deve comentar o pedido de demissão em detalhes, mas ressalta que "entrou pelo mesmo motivo que saiu". "Aceitei o convite para poder somar com o que já foi construído. Para mim não faz sentido que eu continue sem poder ampliar o debate."

Em comunicado sobre a saída de Benites, o Masp diz lamentar mas respeitar a decisão da curadora.

 

Sobre outras demissões recentes no museu

Pelo menos duas pessoas da produção, uma do acervo e o curador-chefe, Tomás Toledo, que estava na instituição havia sete anos, saíram de lá recentemente, mas nenhum dos pedidos de demissão têm relação com a crise envolvendo a mostra e o evento com Boulos.