Inhotim e a grande arte do privilégio
O Estado de São Paulo, 15 de setembro de 2009, Jotabê Medeiro.
Delírio de um multimilionário mineiro da área de mineração, Bernardo Melo Paz, o Instituto Cultural Inhotim é tão grande quanto privilegiado. O centro mineiro de arte contemporânea, desde que se instalou no cenário da arte contemporânea nacional, vem colecionando largos privilégios de verbas e ajudas oficiais. O mais recente: para facilitar o acesso ao local, que fica a cerca de 60 km de Belo Horizonte, o governo de Minas primeiro construiu a estrada Barreiras-Brumadinho. Agora, Inhotim queixou-se que a pontezinha que dava acesso ao gigantesco museu era estreita. Não teve problema: o governo de Minas Gerais começou a construir em tempo recorde, 180 dias, uma portentosa ponte de R$ 2,5 milhões sobre o Rio Manso, além de pavimentar o trecho. Na semana passada, caminhões e tratores trabalhavam furiosamente para finalizar o acesso, embora a velha ponte dê conta do serviço tranquilamente.
A direção do museu considera que, como o Inhotim é o museu mais visitado de Minas Gerais e referência na arte contemporânea, é um fator de desenvolvimento, "o que justificaria qualquer apoio do governo de Minas", considera a diretora executiva do Instituto Inhotim, Ana Lúcia Gazzola.
Do Governo Federal, Inhotim ganhou recentemente a possibilidade de obter renúncia fiscal da ordem de R$ 13 milhões para gastar no seu plano anual de atividades de 2010 a 2011 (vem sendo habilitado para tanto desde 2008, quando captou R$ 1.595.000,00). Somente para a agenda de 2009, teve aprovado R$ 1,1 milhão da Lei Rouanet. Tem patrocínios generosos da Petrobrás e outras estatais mineiras, e subsídios do Fundo Estadual de Cultura. Ainda assim, cobra R$ 15 pela entrada.
Inhotim é como um buraco negro espacial, vai crescendo e engolindo matéria. Mas às vezes encontra resistência. No mês passado, o Tribunal de Contas da União (TCU) descobriu que Inhotim pretendia fazer a municipalidade construir um Centro de Convenções em um dos seus terrenos. Detalhe: doaria o terreno, mas em troca queria o usufruto do Centro de Convenções durante 20 anos. O TCU brecou a manobra.
"Vedado o estabelecimento de condição que confira à entidade privada a gestão do empreendimento que será construído, cuja exploração é prerrogativa do poder público", escreveu o juiz auditor, Augusto Sherman Cavalcanti, ao negar o pedido.
Apesar do percalço, Inhotim continua crescendo pelas beiradas. No dia 29, o centro de arte apresenta 9 novas aquisições de arte contemporânea, obras de gente como Matthew Barney, Doug Aitken, Chris Burden e Yayoi Kusama.
"Muitas das obras foram adquiridas há vários anos, pagas parceladamente ao longo do período e não há estimativa atual de valor venal", explica Ana Lúcia Gazzola. "São obras muitas vezes comissionadas e realizadas pelos artistas no próprio local com custo de material, instalação, além das despesas de viagem e hospedagem. Muitas obras, por suas dimensões, sequer poderiam ser postas a venda, o que dificulta estimar o valor da obra".
No pequeno município de Brumadinho (no Vale do Paraopeba, a 50 km de Belo Horizonte), não pega bem falar mal de Inhotim. Para uma economia baseada na cachaça e na extração mineral, com tímida produção cultural local, o megacentro é uma redenção em todos os sentidos. São 513 empregos diretos gerados. Só para orientar os visitantes nos pavilhões dos artistas, foram contratados 68 estudantes das faculdades locais.
"Até o fim do ano, serão contratados mais uns 30", disse um dos garotos que trabalham como monitores. "É gente das faculdades de Artes, de História, mas tem também gente de Matemática, de setores que não têm nada a ver com arte".
Dona Inês, que vende artesanato de barro na estrada Barreiras-Brumadinho, não titubeia quando é indagada sobre quanto houve de incremento na venda de suas modestas peças após a abertura do Centro de Arte Contemporânea. "Ah, cresceu 100%", jura.
O museu conta com agressiva política de residências artísticas. Mas nem sempre mete a mão no bolso para realizar seus projetos. Na semana passada, teve aprovado pelo Iphan o projeto Manifestações Culturais Quilombolas do Vale do Paraopeba, pelo qual concorria com outras 95 propostas do País. É um programa de patrimônio cultural imaterial. Mas o Iphan entra com R$ 105 mil, e a contrapartida de Inhotim é de apenas R$ 4,3 mil.
Segundo a administração do Instituto Inhotim, o museu é atualmente uma entidade privada, sem fins lucrativos e qualificada pelo governo do Estado de Minas Gerais como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip). Bernardo Paz, seu criador, atua hoje somente como diretor da instituição. O acervo que compõe o complexo foi formado a partir da década de 1980, e tem como foco obras criadas a partir dos anos 1960. Algumas obras do acervo, segundo a direção, foram doadas por artistas ao Inhotim, outras foram cedidas por Bernardo Paz ou empresas associadas a ele. As obras monumentais (fixadas no solo) estão sendo colocadas em comodato de longo prazo.
O museu vende a ideia de que o Parque Tropical possui áreas que seguiram conceitos sugeridos pelo paisagista Roberto Burle Marx. Em 1984, Burle Marx visitou o local e teria apresentado algumas sugestões e colaborações para os jardins. Mas o atual projeto paisagístico é bastante diferente daquela ideia original de Burle Marx. A área é imensa, quase 10% da de todo o município de Brumadinho.
A direção do museu considera que, como o Inhotim é o museu mais visitado de Minas Gerais e referência na arte contemporânea, é um fator de desenvolvimento, "o que justificaria qualquer apoio do governo de Minas", considera a diretora executiva do Instituto Inhotim, Ana Lúcia Gazzola.
Do Governo Federal, Inhotim ganhou recentemente a possibilidade de obter renúncia fiscal da ordem de R$ 13 milhões para gastar no seu plano anual de atividades de 2010 a 2011 (vem sendo habilitado para tanto desde 2008, quando captou R$ 1.595.000,00). Somente para a agenda de 2009, teve aprovado R$ 1,1 milhão da Lei Rouanet. Tem patrocínios generosos da Petrobrás e outras estatais mineiras, e subsídios do Fundo Estadual de Cultura. Ainda assim, cobra R$ 15 pela entrada.
Inhotim é como um buraco negro espacial, vai crescendo e engolindo matéria. Mas às vezes encontra resistência. No mês passado, o Tribunal de Contas da União (TCU) descobriu que Inhotim pretendia fazer a municipalidade construir um Centro de Convenções em um dos seus terrenos. Detalhe: doaria o terreno, mas em troca queria o usufruto do Centro de Convenções durante 20 anos. O TCU brecou a manobra.
"Vedado o estabelecimento de condição que confira à entidade privada a gestão do empreendimento que será construído, cuja exploração é prerrogativa do poder público", escreveu o juiz auditor, Augusto Sherman Cavalcanti, ao negar o pedido.
Apesar do percalço, Inhotim continua crescendo pelas beiradas. No dia 29, o centro de arte apresenta 9 novas aquisições de arte contemporânea, obras de gente como Matthew Barney, Doug Aitken, Chris Burden e Yayoi Kusama.
"Muitas das obras foram adquiridas há vários anos, pagas parceladamente ao longo do período e não há estimativa atual de valor venal", explica Ana Lúcia Gazzola. "São obras muitas vezes comissionadas e realizadas pelos artistas no próprio local com custo de material, instalação, além das despesas de viagem e hospedagem. Muitas obras, por suas dimensões, sequer poderiam ser postas a venda, o que dificulta estimar o valor da obra".
No pequeno município de Brumadinho (no Vale do Paraopeba, a 50 km de Belo Horizonte), não pega bem falar mal de Inhotim. Para uma economia baseada na cachaça e na extração mineral, com tímida produção cultural local, o megacentro é uma redenção em todos os sentidos. São 513 empregos diretos gerados. Só para orientar os visitantes nos pavilhões dos artistas, foram contratados 68 estudantes das faculdades locais.
"Até o fim do ano, serão contratados mais uns 30", disse um dos garotos que trabalham como monitores. "É gente das faculdades de Artes, de História, mas tem também gente de Matemática, de setores que não têm nada a ver com arte".
Dona Inês, que vende artesanato de barro na estrada Barreiras-Brumadinho, não titubeia quando é indagada sobre quanto houve de incremento na venda de suas modestas peças após a abertura do Centro de Arte Contemporânea. "Ah, cresceu 100%", jura.
O museu conta com agressiva política de residências artísticas. Mas nem sempre mete a mão no bolso para realizar seus projetos. Na semana passada, teve aprovado pelo Iphan o projeto Manifestações Culturais Quilombolas do Vale do Paraopeba, pelo qual concorria com outras 95 propostas do País. É um programa de patrimônio cultural imaterial. Mas o Iphan entra com R$ 105 mil, e a contrapartida de Inhotim é de apenas R$ 4,3 mil.
Segundo a administração do Instituto Inhotim, o museu é atualmente uma entidade privada, sem fins lucrativos e qualificada pelo governo do Estado de Minas Gerais como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip). Bernardo Paz, seu criador, atua hoje somente como diretor da instituição. O acervo que compõe o complexo foi formado a partir da década de 1980, e tem como foco obras criadas a partir dos anos 1960. Algumas obras do acervo, segundo a direção, foram doadas por artistas ao Inhotim, outras foram cedidas por Bernardo Paz ou empresas associadas a ele. As obras monumentais (fixadas no solo) estão sendo colocadas em comodato de longo prazo.
O museu vende a ideia de que o Parque Tropical possui áreas que seguiram conceitos sugeridos pelo paisagista Roberto Burle Marx. Em 1984, Burle Marx visitou o local e teria apresentado algumas sugestões e colaborações para os jardins. Mas o atual projeto paisagístico é bastante diferente daquela ideia original de Burle Marx. A área é imensa, quase 10% da de todo o município de Brumadinho.