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Ato em repúdio à MP 841 une setores da cultura, educação e esporte no combate à violência

Fonte: Site da OAB SP, publicado em 05/07

Ato em repúdio à MP 841 une setores da cultura, educação e esporte no combate à violência

Marcos da Costa, presidente da OAB SP, durante o ato em Defesa da Cultura Brasileira

O caminho para a transformação da desigualdade social e do atual quadro de violência vivenciado pela sociedade brasileira passa obrigatoriamente pela cultura, educação e esporte. Esta foi a constatação dos representantes dos respectivos setores durante Ato em Defesa da Cultura Brasileira e em repúdio à Medida Provisória 841, no Teatro da PUC SP, o TUCA (04/07). A Medida Provisória (MP) diminui os recursos arrecadados com as loterias federais e destinados ao Fundo Nacional de Cultura (FNC) de 3% para 0,5%. Com presença expressiva das lideranças desses setores, a OAB SP capitaneou a iniciativa e na ocasião anunciou que dará início à tramitação perante o Conselho Federal da OAB de pedido para proposição de Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra a MP.

Na abertura do ato, o presidente da OAB SP, Marcos da Costa, relembrou a atuação da Secional paulista e da sua Comissão de Direito às Artes para a proposição de ação civil pública com o objetivo de descontingenciar os recursos arrecadados com as loterias, que não estavam sendo repassados ao fundo da cultura, conforme estipula a Lei Rouanet (8.313/91). Agora, com a MP 841, serão retirados cerca de R$300 milhões da cultura, R$500 milhões do esporte olímpico e R$1,3 bi do Fundo de Financiamento Estudantil (FIES).

“Estes recursos representam apenas uma gota em face de um oceano de dinheiro que já é destinado à segurança. São recursos que farão muita falta nos setores da educação, cultura e esporte em nosso país, setores estes que constroem a cidadania e estão ligados à segurança, na medida em que formam os nossos cidadãos. O problema da segurança está na gestão destes recursos. Este ato representa a soma dos esforços de diversas áreas em face dessa tentativa de alterar o curso deste dinheiro. A sociedade precisa se sensibilizar de que é através da cultura, educação e esporte que fortaleceremos a cidadania e assim é que mudaremos o atual quadro de violência que assola o país”, defende o presidente da OAB SP.

Reverberação para o Brasil
Presidente da Comissão de Direito às Artes da OAB SP, Evaristo Martins de Azevedo destacou a mobilização em todo o país contra a MP 841: “Quando soubemos da MP 841 mobilizamos todos os segmentos das artes e é importante reverberar isso para o Brasil inteiro. Todos estão perplexos, por isso esta mobilização suprapartidária de todas as linguagens, partidos, cores e bandeiras. Acreditamos que é por meio da arte, cultura, educação e esporte, que os problemas da segurança serão minimizados”.
Com a retirada de recursos do FIES, a presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Marianna Dias, apontou para a importância do financiamento estudantil, que possibilitou o ingresso de uma nova geração de jovens nas universidades: “O FIES representa o retrato de um Brasil diferente, que estava superando as suas desigualdades sociais”. Para a diretora executiva da Associação Atletas pelo Brasil, Louise Bezerra, a MP representa um desmando e um desmonte dos direitos sociais: “É muito mais lucrativo para certos setores investirem em bala e em presídio, mas não podemos fazer isso, esse não é o caminho que vai tirar a nossa juventude da violência”.

Cultura no combate à violência
Vice-presidente da Comissão de Direito às Artes da OAB SP, diretor do Instituto Volpi e presidente da Associação dos Amigos do Museu de Arte Contemporânea (AAMAC), Pedro Mastrobuono citou como exemplo de combate à violência através da cultura, a cidade de Medellin na Colômbia, em contraste com a situação do Rio de Janeiro, que passa por intervenção militar: “É importante ressaltar que a MP já está em vigor, um segundo ponto é que a lei não está sendo cumprida, e esta não é só uma questão de cultura, mas de cidadania. 

Neste país, todo cidadão é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa em virtude da lei, lei feita no Congresso por quem tem legitimidade. Não se pode alterar algo que a sociedade escolheu como a sua verdade através da lei, que representa um anseio social, com uma Medida Provisória que retira dinheiro da cultura, que é sim um importante instrumento de combate a violência, para se jogar dentro da má administração dos recursos da segurança pública”.

Representando o Fórum Brasileiro pelos Direitos Culturais (FDBC), o maestro Amilson Godoy reforçou que será através da arte que será realizada a transformação que o país necessita. Já o presidente da Associação Nacional das Entidades Culturais Não Lucrativas (ANEC), Ricardo Ohtake, ponderou que a perda dos recursos afetará, principalmente, as pessoas em situação de maior vulnerabilidade econômica, nas periferias e nos centros distantes do país: “Essa camada mais pobre da população mais uma vez é prejudicada por uma política equivocada que o governo federal exerce no sentido de transferir para resolver um problema, que já é resultado da falta de recursos nessas atividades que vão formar os cidadãos do país”, avaliou.

Consequências a longo prazo
O vice-presidente da Cooperativa Paulista de Teatro, Thiago Vasconcelos, observou que estas políticas públicas independem de governo e convocou o exercício da imaginação: “O presente é consequência do futuro, porque se hoje uma criança estuda é porque ela imagina que depois vai prestar o vestibular, vai exercer o que está estudando. Se hoje estamos aqui é porque imaginamos um futuro com cultura”. Na mesma linha, o presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos e Diversões (SATED SP), Dorberto Carvalho, enalteceu a luta da OAB SP pela defesa dos direitos fundamentais e pontuou sobre a importância deste setores para a segurança: “Ninguém é a favor de retirar verba da segurança, mas defendemos que o problema da segurança, tão reivindicado por toda população, não será resolvido em favor daquilo ou disso, e sim com a segurança, a cultura, o esporte e a educação. É um equívoco tentar opor segurança pública e esses setores, são ações preventivas na cultura, educação e esporte que serão os antídotos contra a violência que vivemos hoje”.

Enquanto vice-presidente da Associação dos Produtores Teatrais Independentes (APTI), o ator Odilon Wagner contextualizou os efeitos da Lei Rouanet, do Fundo Nacional da Cultura e da MP 841: “Tem muitos artistas que tem capacidade de ir para o mercado captar dinheiro, e muitos que nunca terão acesso a esses recursos do mercado. O Fundo Nacional da Cultura foi criado justamente para equilibrar esse sistema, pois iria descentralizar os recursos que ficam nos grandes centros e chegar até os pontos mais distantes do país, e também nas periferias das cidades. Estes recursos estão sendo retirados daqueles que mais necessitam para produzir cultura e arte. Não há outra saída para o problema da violência no país se não através destes caminhos”, defendeu.

Gerente do jurídico do Itaú Cultural e integrante da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC) do Ministério da Cultura e membro da Comissão de Direito às Artes, Anna Paula Montini encerrou o ato apresentando os encaminhamentos a partir do Manifesto: “Tantos afetos, sensibilidades, potências e competências estão aqui mobilizados pela mesma causa, que é a transformação do país, porque onde há esporte, educação e cultura não entra a violência. A violência não entra na quadra, violência não faz escola, e a violência não vira espetáculo. Este manifesto passa a correr por todo o país e chegará ao conhecimento do presidente da república. Também promoveremos audiência na Câmara contra a MP 841, e iremos à Brasília em uma força-tarefa pela ação que hoje tramita contra o contingenciamento dos 3% da loteria para que esse dinheiro chegue ao devido destino. E A OAB SP dará início à tramitação perante o Conselho Federal da OAB para proposição de uma ação direta de inconstitucionalidade contra a MP 841”, encerrou a advogada.

MANIFESTO EM DEFESA DA CULTURA

A grandeza de uma Nação se constrói nos avanços civilizatórios conquistados ao longo de sua trajetória, assentados em suas riquezas materiais e imateriais, naqueles que representam a potência natural de seu território e, acima disso, no poder econômico que adquire a partir do trabalho e do conhecimento.

Tal grandeza se concretiza e se manifesta no pensamento crítico e na diversidade de seu povo, nas crenças, hábitos, costumes, atitudes e tradições que formam a identidade nacional. Essa é a base viva, é a Cultura, que permite a integração de grupos e indivíduos, reforçando sentimento de pertencimento, unindo esperanças, sonhos, solidariedade e aspirações comuns. Sem ela, os laços sociais se rompem, a Nação mergulha no caos.

Infelizmente, mais uma vez, nossos governantes dão as costas à Nação e seu processo civilizatório: através da Medida Provisória 841, retiram 319 milhões do Fundo Nacional de Cultura, 514 milhões de reais do Esporte e os recursos do Fies, transferindo-os para uma pretensa segurança pública. Menosprezar a Cultura e a educação é alimentar a barbárie e a insegurança.

O ciclo de violência por que passa o país exige reforços e complementos financeiros para prevenção e combate às máfias criminosas que expandem a violência pelo território. Mas essa ação exige mais recursos para a Cultura e a Educação, e não menos. Na decisão governamental, “o remédio torna-se o veneno” eis que não se tratam os sintomas de uma doença que é justamente fruto da desvalorização da nossa cultura e educação.

A defesa da Cultura, da Educação e da segurança pública exige a revisão da Medida Provisória 841. O governo federal precisa abrir a discussão pública para um combate mais consequente aos processos sociais que levam ao crescimento da insegurança. Acreditamos que esses reforços e complementos passem por mais recursos para a cultura, educação e áreas que historicamente contribuem para a interrupção dos ciclos perversos que alimentam os problemas sociais e econômicos que operam como dispositivos seminais para a violência.

Assinam entidades, movimentos, cidadãos:
OAB SP – Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo
Fórum Brasileiro pelos Direitos Culturais
CPT – Cooperativa Paulista de Teatro
APTI- Associação de Produtores Teatrais Independentes
SATED/SP – Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões no Estado de São Paulo
ANEC – Associação Nacional de Entidades Culturais não Lucrativas
CBEC – Conselho Brasileiro de Entidades Culturais.
UNE – União Nacional dos Estudantes
CUCA – Circuito Universitário de Cultura e Arte
Associação Atletas pelo Brasil