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A eternidade de Hélio Oiticica

Dodô Azevedo (blog Dodomundi, 17/10/2009)

matéria originalmente publicada no blog Dodomundi


Esse post, sobre as reações apaixonadas diante da destruição do acervo de Hélio Oiticica iria ser longo. Mas o LUTO se impôs aqui. Então vamos direto ao assunto. Estava eu em casa, numa adorável tarde chuvosa em Laranjeras, Rio de Janeiro, trovejando aos berros! "Quero matar os Oiticica!", "Quer dizer que 90% da Obra de Hélio Oticica estava numa casa particular? Que absurdo!". Então, entrei em contato com um dos integrantes do Projeto Oiticica, instituição criada pelos herdeiros do artista para cuidar do acervo. O papo foi emocionado. Enxugando as lágrimas, ficou mais ou menos assim, num esquema EU pergunto e EU mesmo respondo, baseado no papo inteiro:

1. O que causou o incêndio na Reserva Técnica particular da família Oiticica?

Provavelmente duas falhas de equipamento. A 1a num dos desumidificadores, que teria entrado em curto e a 2a no detector de fumaça, que alertaria a família, que jantava no 2o andar da casa.

2. Estes equipamentos estavam perfeitas condições?

Segundo o Projeto Oiticica e o órgão público IPHAN, sim. Os 6 profissionais, entre eles,pesquisadores, curadores e museólogos, que trabalhavam diariamente com o acervo, explicam que o cuidado com a segurança da Sala Técnica da família Oiticica era padrão.

3. Então o que aconteceu foi um acidente inevitável?

Incêndios históricos em Reservas Técnicas aconteceram exatamente desta maneira no Brasil. Não há Reserva Técnica 100% segura no mundo.

2. De uma escala de 0 a 10, o quanto a Reserva Técnica da casa particular dos Oticica era segura?

Eu, Dodô, não posso avaliar com precisão. O fato é que a Reserva Técnica dos Oiticica cumpria todas as exigências técnicas exigidas pelo IPHAN. Carlos Fernando Andrade, superintendente do órgão, visitou a Reserva Técnica particular dos Oticica e a aprovou.

3. As obras de Hélio Oiticica deveriam estar no Centro Hélio Oticica, e sob os cuidados do Estado?

O Centro Cultural Hélio Oiticica não possui climatizaçao nem umidade controlada, por exemplo. Além de uma porta das Reservas Técnicas (lá são duas) não ter tranca, pois o banheiro dos funcionarios fica lá dentro.


4. Reservas Técnicas particulares são menos seguras que as mantidas pelo Estado?

No Brasil, principalmente, não. De MASP a MAM, furtos e incêndios acontecem com maior frêquencia do que em acervos particulares, geralmente tratados com mais cuidado e recursos (dinheiro). A Reserva Técnica do MAM é considerada pelo pessoal do meio "uma lástima". A do MAC "fica praticamente no meio da Rodoviária de Niterói." Há Reservas Públicas no Rio excelentes, como a do Museu da República e a do Museu Histórico Nacional. No mundo inteiro Reservas Particulares, de colecionadores, são com frequência mais bem guardadas do que as Públicas, sujeitas, em países como o Brasil, à vontade dos admistradores eleitos. Nas Reservas Técnicas Particulares, até por questão de mercado, as Obras de Arte são tratadas como jóias num cofre. A questão a ser discutida é: deve o Estado intervir caso os herdeiros não tenham condições, sejam finaceiras, sejam técnicas, de manter um acervo?

5. Os herdeiros de Oiticica tinham condições, sejam finaceiras, sejam técnicas, de manter um acervo?

Sim, financeiras e técnicas.

6. Se os herdeiros tinham essas condições por que estavam negociando, segundo matéria do Globo Online de hoje, com um museu americano a guarda do acervo?

Matéria mal apurada. Era um convênio apenas para o Catalogue Raisonne do artista em convênio com o Museum of Fine Arts de Houston.

7. O que foi perdido foi exatamente 90% do acervo do Hélio Oticica?

Um pouco menos que isso. Grande parte dos desenhos e os Metaesquemas foram salvos. Parte da maquete "Cães de Caça", por exemplo, foi salva. Há obras em comodato fora do país. Muitas obras são conceituais, podem ser recriadas. Outras tantas não. Mas só poderá ser precisado melhor na próxima semana.

8. E os Parangolés? É verdade que todos foram queimados? Não existem mais Parangolés de Oiticica?

Todos os Parangolés que estavam aqui no Rio foram queimados. Mas há 2 parangolés originais emprestados na Bélgica e 3 réplicas no Brasil. César Oticica, em estado de choque ainda maior que todos nós juntos, esqueceu de citar hoje na imprensa esses Parangolés emprestados.

9. De toda a tragédia, o que de mais valoroso foi perdido?

Os projetos foram salvos, vários penetráveis podem ser refeitos, segundo as plantas deixadas pelo Hélio. Entretanto, "O GRANDE NÚCLEO", por exemplo, composto por três obras penduradas no teto formando um labirinto que o visitante deveria adentrar, exposto apenas uma vez no Rio, foi perdido pra sempre.