Marilyn Monroe e Albert Einstein downloaded

relato da palestra de Peter Ride, por Daniela Castro


Citando uma anedota em que Marilyn Monroe demonstra seu conhecimento sobre a teoria da relatividade para Albert Einstein, Peter Ride, o convidado internacional da última mesa do Simpósio, enfatiza a reação inesperada do cientista frente  ao entendimento de um dos mais famosos símbolos sexuais da história sobre uma das mais revolucionárias teorias da física. Para a surpresa de Einstein - e também da platéia no Paço das Artes - Monroe responde que não a entendeu, mas que simplesmente se informou sobre ela.

Um dos primeiros a desenvolver curadorias com novas mídias, o curador e diretor do Centre for Arts, Research, Technology and Education da University of Westminster, Peter Ride abriu sua apresentação sugerindo um paradigma de diferenciação entre o entendimento (understanding) e o acesso à informação (knowing) para avaliar as problemáticas envolvidas nos processos de arquivamento e de escrita da história recente das novas mídias.

O ponto de partida foi a constatação de que a própria tecnologia vem mudando a noção de maneiras de arquivar. A inovação tecnológica, calcada na aceleração, momentum e velocidade, determina tanto as práticas artísticas com novas mídias, como também cria uma noção de determinismo tecnológico. Segundo Ride, a tecnologia acaba por determinar o contexto onde ela atua ao mesmo tempo em que define o conteúdo para este contexto.  O problema está na validação do conhecimento gerado através da tecnologia sem um entendimento profundo sobre os instrumentos, os softwares, que a caracterizam (ver, por exemplo, a discussão sobre software como ideologia em Alexander R. Galloway, “Language Wants To Be Overlooked: On Software and Ideology”. Journal of Visual Culture, Vol. 5, No. 3,  315-331 (2006)).

Frente a essa problemática, Ride aponta para uma fissura entre a maneira como as pessoas compreendem a tecnologia e questões de apresentação, exposição, conservação, preservação, arquivamento e acesso a trabalhos com novas mídias. Os arquivos contém conhecimento ou uma coleção de dados informativos? O curador propõe uma mudança de termos em sua análise, que parte de “arquivos vivos” para “histórias vivas”, mas destaca: “histórias de quem? Para quem? Que tipo de legado essas histórias deixarão?”

Para Ride, a inovação tecnológica é também parte de uma prática crítica, pois afeta e transforma a subjetividade daquele que cria com ela e daquele que a recebe (artista e audiência). O tempo é relativo à posição do observador, que precisa do contexto específico da época em que o trabalho foi criado para poder entende-lo (e não somente informar-se sobre ele). Portanto, uma possível linha do tempo que trace uma perspectiva histórica das mídias não se sustenta. Por exemplo, o Institute of Unstable Media (www.v2.nl), em Rotterdam, oferece a noção de “mídias instáveis” como substituição ao termo “novas mídias”, partindo da lógica da dificuldade de determinar um estado “original” do trabalho artístico-midiático.  Em função da rápida aceleração e mudança de paradigmas de percepção que acompanham as inovações tecnológicas, a própria noção de história linear cai por terra. Parte-se, então, da experiência vivida e trocas horizontais com artistas e suas obras para pontuar momentos relevantes no fazer artístico e teórico no campo das novas mídias. Reid conclui dizendo que não vivemos um tempo de hiper-amnésia, e sim elaboramos novas maneiras de gerar, acessar e entender novos mecanismos de representação do mundo.

PS: Estudos de Caso – artAIDS e Technosphere

Peter Ride mencionou alguns projetos artísticos que ilustram as questões abordadas acima. O artAIDS (1994-98) foi um projeto experimental e coletivo que aconteceu na web, onde vários artistas postavam imagens e textos que ilustravam suas impressões sobre a doença. O projeto lidou com o caráter comunitário que a preocupação com a epidemia carregava, como também o caráter comunitário da criação e distribuição da informação na web.

Já em Technosphere, Ride usou esse projeto da artista Jane Prophet (que teve uma individual no Paço das Artes em 2006) para ilustrar a impossibilidade de se aplicar noções museológicas de preservação e conservação nas artes mídiaticas. A artista criou um animal na web, que lá viveu por 7 anos (1995 – 2002). Depois de muito dinheiro e energia investidos no projeto, Prophet decidiu abandoná-lo e hoje ele só existe em arquivos de documentação. O projeto, como primeiramente intencionado pela artista, não existe mais.