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MESA 3 (manhã) – Curadoria & crítica

Por Ana Maria Maia*

Sábado, 8 de março de 2008 

Luisa Duarte (RJ), Marisa Florido (RJ), Juliana Monachesi (SP). Mediação: Moacir dos Anjos (PE) 


Fim de mesa, fim de sábado (08/03) à tarde. Alguém da platéia pergunta: “Pensando a ética como via de visibilidade, não seria o trabalho do curador uma outra obra?”. Resposta 1: “Ética diária tem a ver com envolvimentos cotidianos”. Resposta 2: “Curadoria é uma resposta a uma obra, mas que não deixa de ser autoral”. Resposta 3: “Não há resposta do que é ética, porque isso é uma negociação incessante, assim como o ato de curar”. Respondem, respectivamente, Juliana Monachesi, Luisa Duarte e Marisa Florido, convidadas pelo Seminário Panorama do Pensamento Emergente para um painel que tematizou convivências entre curadoria e crítica e levantou hipóteses de autorias compartilhadas para as montagens de arte. Moacir dos Anjos fez às vezes de mediador e recorreu a termos como “aceitação” e “horizontalidade” para costurar as intervenções. 

“Orientada a falar em primeira pessoa”, a curadora independente e professora da Faculdade Santa Marcelina (SP) Luísa Duarte iniciou a mesa. Do trânsito por entre experiências de uma carreira ainda recente, vislumbrou na polaridade curadoria-crítica a possibilidade de completude de apropriação do “conteúdo inteligível de uma obra”, segundo terminologia de Walter Benjamin. A crítica, para Luisa, lida com um tempo dilatado; o texto analítico demanda reclusão. Já a curadoria -muda tom de voz e alivia o peso nas palavras- trata do exercício de olhar sobre o espaço. Torna-se o curador, portanto, num campo expandido em que habita não só arquitetura como a presença do texto, um “levantador de sintomas”, como disse à edição sete da revista Número (/.rede/numero/rev-numero7) o atual curador da Bienal de São Paulo e também moderador do seminário Ivo Mesquita, que, da platéia, ouvia a citação. 

Por levantar sintomas, nesta primeira década dos 2000, Luisa pontualmente entende pensar utopias e estabelecer micropolíticas. “A produção atual está preocupada com uma contemporaneidade lato expandida”. Sintoma que captura; que a motiva a expor interesses de pesquisa exemplificados através da mostra Entre o público e o privado, resultado do mapeamento feito em conjunto com Cristiana Tejo, Marisa Mokarzel e Lisette Lagnado para o projeto Rumos Visuais, do Itaú Cultural, em 2005/2006; que a confortam na conclusão de que a intersecção dos lugares de crítica e curadoria para que ali tentou reportar-se seja uma comum condição de “observatório do mundo”. 

“Arte para mim é endereçamento. Solicita a palavra, mas não deseja reduzir-se a ela”, postula Marisa Florido em sucessão a Luísa, costurando pontos levantados e anunciando a visão de um mesmo “observatório”, em que, no entanto, reforça atuações e investiga os limites da geração de conhecimento. Limites intrigantes à arquiteta de formação que, de uma licença de seu cargo no setor de urbanismo da Prefeitura do Rio de Janeiro, tirou a chance de “aprender aquilo que lhe escapava”. Foi estudar arte. Ainda por impulso e sem assumir-se curadora ou crítica levou ao mestrado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) a primeira de suas apostas nos endereçamentos. Desta vez reportava-se ao espectro de criação, ao Ateliê do Artista e, mais tarde, já no doutorado –também na UFRJ-, baseada na mostra de intervenções urbanas Sobre Assaltos, de 2001, assumia o espectador como objeto de pesquisa.  

Para guiar-se entre referências, Marisa leu tópicos textuais pré-concebidos, intercalados com comentários e projeções de imagens de algumas de suas curadorias. Assumindo a alteridade na narrativa de sua trajetória, não se ateve a posicionar-se entre crítica e curadoria, reforçou a transitoriedade das relações que vive o profissional em questão e usou da espontaneidade para falar de seu amor pela arte. Amor que também pauta Juliana Monachesi, última palestrante, feliz com o encontro e assumidamente em crise com a atividade curatorial. “A figura do curador está em declínio e não em ascensão”, acha, a partir de motivações pessoais, mas estendendo a constatação a um movimento de “desrecalque” dos artistas, que, dos 2000 pra cá, voltam a promover espaços e iniciativas. “Eu não estou vendo a arte acontecer no museu. Ela está nas casas das pessoas, na rua”, completa sem maiores articulações. 

Revirando nortes para o campo e para seu próprio currículo de realizações, Juliana apresenta fotografias de dois projetos: A casa onírica, que organizou em 2003, em instituição do interior de São Paulo e ctrl C + ctrl V: recortar e colar, de 2007, no Sesc Pompéia (SP). O primeiro, um sintoma –“’Roubei’ do Bachelard um texto referenciado que embasasse minha proposta”- e o segundo, uma reação aos hermetismos do sistema, por um lado, e aos erros e precipitações de uma curadora “jovem e insegura”, por outro. Juliana é jornalista, ainda atuante no jornal Folha de São Paulo e em publicações especializadas, e refugia conforto no texto e na academia. Cultivando diálogos não hierarquizados entre arte e comunicação, defendeu mestrado em que se perguntava “como a crítica de arte pode dar conta da produção em arte digital”. Num doutorado que desde já planeja empreender, quer pesquisar “ecologia cultural”, algo que a leve a pensar sobre os desperdícios –de texto, de exposição, de curadores, de investimento público- e que a motive na busca de coerências. 

*Ana Maria Maia é jornalista, coordenadora do Portal Dois Pontos (www.doispontos.art.br) e relatora do projeto Panorama do Pensamento Emergente.