As artes visuais na era da apropriação simbólica pelo capital, Angelica de Moraes
Comunicações: dia 09 de agosto, 18h. Auditório 1.
Resumo
Como sabemos, na Renascença o artista mudou seu status social, passando da esfera anônima dos ofícios manuais para afirmar-se como autor, ou seja, detentor de um conhecimento capaz de gerar identidade. Sua identidade como artista, em primeiro lugar. Por conseqüência e ao estabelecer poéticas individuais, ele passa a ter reconhecido seu protagonismo de gerador de fatos culturais e agente sedimentador da cultura em que está mergulhado. A lógica de mercado da contemporaneidade, no entanto, trabalha na contramão. Realiza uma crescente expropriação do território simbólico do artista. O lugar da produção simbólica da arte precisa ser profundamente repensado neste século 21.
Que cultura temos hoje? Uma cultura em que se aproximam cada vez mais – talvez em rota de colisão, combustão e fusão – a produção de símbolos culturais e a produção de símbolos para mover a economia. As palavras marketing cultural, estratégia de inserção, público-alvo e valor agregado são os novos mantras da contemporaneidade. É a cultura das marcas, que tanto movimenta a indústria do luxo quanto a indústria do varejo globalizado. Que envolve desde a produção de bolsas Louis Vuitton quanto o hambúrguer Mc Donald, esses avatares da globalização.
Nessa cultura de massas, que Guy Debord tão bem observa ser a “sociedade do espetáculo”, o papel do artista se afasta cada vez mais do protagonismo. Pela lógica do mercado, ele é apenas mais um dos elementos de uma equação que não tem mais como finalidade expandir o conhecimento ou a percepção de mundo do espectador mas sim levá-lo a consumir. Há o atrelamento a uma lógica extra-arte. Um exemplo nítido desta prática ocorreu no ano passado, em São Paulo, com a exposição patrocinada pelos cigarros Souza Cruz e a marca Carlton. O candidato a expectador da exposição de Nuno Ramos e Frank Stella deveria, antes, registrar sua condição de fumante. Não sendo fumante, estava automaticamente alijado da fruição daquelas obras de arte. A alternativa aos barrados, sussurrada pelos assessores de imprensa, era registrar-se com outro nome e, então, mentir ser fumante. Ou seja, despir-se de sua identidade em reverência à marca e seus alvos de mercado.
Ao mesmo tempo, o neoliberalismo transformou a política cultural oficial do governo em todos seus níveis em meros agentes de cessão de renúncia fiscal para os empresários privados fazerem a programação e gestão direta do circuito. Neste ponto realizo uma comparação entre a política de Gustavo Capanema na Era Vargas e a política cultural brasileira da última década. Desde ao anos 1990 e mesmo um pouco antes, governos aparentemente oriundos de extratos partidários diversos, promoveram a mesma e continuada transferência de gestão da cultura para os oligopólios e plutocracias que fazem desse setor um cartão dourado de aceitação social.
Plutocratas, legitimados pelo protagonismo na cena cultural, fazem crescer, prosperar e até falir fraudulentamente suas empresas. Enquanto isso, o circuito cultural se torna cada vez mais afastado de seu objetivo final ideal – a educação da população e a expansão da percepção de mundo do cidadão – em nome dos objetivos momentâneos das marcas na conquista e consolidação de uma base consumidora cada vez mais ampla, voraz e acrítica.
O fenômeno é internacional e, não por acaso, o circuito dos museus e grandes eventos culturais está cada vez mais sendo organizado segundo a lógica do mercado e dos espetáculos geradores de boa imagem para produtos de consumo e serviços. Até mesmo os experimentos de ponta da arte digital estão sendo instrumentalizados e distorcidos para se transformarem em meros cenários impactantes para o lançamento de aparelhos de telefonia ou cerveja. Vivemos, como José Luis Brea observa, “o fim do sujeito como singularidade” e a transformação total do lugar do artista na sociedade.
No século 21, o artista será “um gerador de riqueza imaterial”, mas não mais estará ocupando o grau mais alto, aquele que Kant chegou a classificar como o de demiurgo da sociedade. O pensamento e a prática artística, em graus mais evidentes ou sutis, estarão instrumentalizados pela economia de mercado. O entendimento desse mecanismo pode levar à formulação de estratégias alternativas. O trabalho em grupo e a busca de espaços não oficiais de exibição é um sintoma disso, bem evidente entre os jovens artistas. Mas ainda é uma prática ingênua diante da lógica plenamente vitoriosa do capital glamurizado pela arte.
O artigo que pretendo apresentar no simpósio tem esse viés, alicerçado na seguinte
BIBLIOGRAFIA: BREA, José Luis. El Tercer Umbral. 2004. Ed. Cendeac, Múrcia, España. DEBORD, Guy. A Sociedade do Espetáculo. 1997. Ed. Contraponto, RJ. ADORNO, Theodor. Indústria Cultural e Sociedade. 2002, Ed. Paz e Terra, SP. Entre outros...
Angélica de Moraes |
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