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As revistas e seu duplo

relato por André Mesquita

Relato da mesa “Editorial Revistas de Arte”, SP-Arte 2011

 

Revistas em papel ainda são canais importantes em termos de legitimação do trabalho de artistas e de seus circuitos, tão essenciais quanto a rapidez dos modelos editorais de publicação virtual. Esse foi apenas um dos diversos pontos levantados durante a conversa realizada no auditório do MAM com os editores de três publicações – a revista brasileira Select [http://www.select.art.br], recém-lançada na feira SP-Arte 2011, a colombiana ArtNexus [http://www.artnexus.com] e a espanhola Dardo [http://dardonews.com/dardonews/dardomagazine].

Publicada por uma grande empresa de comunicação e de caráter comercial, Select quer enfatizar – diz a editora Paula Alzugaray – a proximidade de funções que parecem de início tão distintas, mas que podem convergir em uma revista. A editora propôs pensar na revista de arte como um lugar onde as atividades curatorial e editorial se encontram, sendo a publicação “um espaço de curadoria colaborativa”, ou ainda um “espaço onde as responsabilidades pela definição da pauta e pela autoria da edição são compartilhadas”. Se antes da internet uma revista se colocava como uma “duplicação do mundo real”, ela também pode ser um “duplo do fórum de debates” e um “duplo do espaço expositivo”. No entanto, a passagem para essas esferas (do expositivo ao editorial), diz Alzugaray, é imperfeita e depende de uma série de traduções.

Baseado na cidade de Santiago de Compostela, O editor da Dardo, David Barro, também concorda com o que fala Alzugaray sobre a aproximação do trabalho editorial e curatorial, o que permite a ele “trabalhar com aquilo que nos apaixona”. Acrescenta que falta mais crítica nas publicações de arte. “Se você critica, cortam a publicidade”, diz recordando ainda o momento de crise econômica no qual vive a Espanha. Alzugaray destacou a importância do caráter propositivo das revistas de arte como um meio crítico, que para além do formato dos dossiês adotados por publicações como a espanhola Artecontexto [http://www.artecontexto.com] e a brasileira Trópico [http://www2.uol.com.br/tropico], pode se desdobrar tanto na escolha das pautas como a organização dos textos nas páginas e na heterogeneidade dos temas e dos colaboradores de Select, que vão desde o crítico de arte, o professor, o estudante e o jornalista, até um roteirista de cinema ou um empresário da noite. 

Se Alzugaray vê na diversidade das pautas e nos colaboradores de Select uma forma de “re-situar a arte em outros debates intelectuais”, Barro afirma buscar com Dardo uma espécie de “conexão emocional”, seja essa conexão com o leitor ou através dos temas que pretende abordar. Ele dedicou sua fala ao outro editor e fundador de Dardo, o curador e crítico brasileiro Paulo Reis, falecido em abril deste ano, e que teve uma trajetória marcada pela generosidade e apoio a diversos artistas. Barro definiu-se como um “editor sem dinheiro”, “com total vocação suicida”, e que com Reis decidiu iniciar uma aventura montando uma revista de alcance internacional, trabalhando com os contextos brasileiro, espanhol e português em uma cidade até então isolada dos grandes centros europeus de arte contemporânea.

O outro momento da mesa ficou centrado em questões econômicas e nas estratégias de distribuição das revistas. A veterana ArtNexus, que começou há 35 anos na Colômbia (chamada inicialmente de Arte en Colombia), passou por dificuldades de circulação comuns no meio impresso, levando-a a lançar um portal na internet onde o conteúdo da revista é publicado periodicamente. “O que fez a ArtNexus ter sobrevivido todos esses anos é porque a revista nunca foi encarada como um negócio, mas quase como uma fundação”, comenta a editora Celia S. de Birbragher. Essa integridade do espaço editorial, diz a editora colombiana, é o que faz com que a revista chegue ao público. Um sistema de assinaturas, edições inteiramente em inglês e o fenômeno das feiras de arte permitiram que a ArtNexus circulasse em outros países.

Birbragher lembra que as feiras de arte também são um lugar que deve ser pensado como um espaço de acesso às publicações. Sobre este tema, Barro faz uma colocação importante sobre a SP-Arte “Uma feira em que 90%, 95% dos participantes é brasileira... Como que o artista brasileiro vai circular? [...] As revistas têm um papel importante, que é o de distribuir esses artistas. A internet realiza esse trabalho, mas a revista em papel chega com outro rigor e seriedade. [...] Na Espanha, há uma euforia acerca das feiras de arte, como a Arco, que hoje vive uma situação catastrófica. A arte necessita de uma reformulação com mais responsabilidade e sustentabilidade. [...] É preciso trabalhar muito para que não fique só na euforia.”

Na platéia, começam a surgir perguntas sobre a circulação das revistas. Birbragher diz que as revistas comerciais têm essa dificuldade de distribuição, pois hoje há muitas publicações culturais e os custos de transporte (por exemplo entre Colômbia e Brasil) são altíssimos. Os editores estrangeiros comentam o fato de que no Brasil, fazer a distribuição de suas revistas é praticamente inviável. O mesmo ocorre com a produção de livros, que para Barro, ainda é um artigo de luxo no país, as gráficas de qualidade são caras e o processo de produção é muito lento. Surgem alguns comentários vindos do público para contextualizar esta situação no Brasil. Especialmente no que diz respeito à mudança ocorrida nos oito anos de governo Lula, quando se começou a lançar editais públicos de apoio a publicações de revistas (inéditas ou não), por exemplo através do Programa Cultura e Pensamento do Ministério da Cultura[1]. Coletivos artísticos, até então com pouca visibilidade e ajuda financeira, artistas individuais e críticos de arte conseguiram apoio para a publicação de livros, como foi o caso do Edital Brasil Arte Contemporânea, promovido pela Fundação Bienal em parceria com o MinC. Com o governo Dilma e a mudança recente no Ministério da Cultura, resta saber e aguardar como ficarão os subsídios públicos para as publicações e os projetos contemplados na gestão anterior, sendo que muitos ainda não foram lançados[2].



[1] Entre os exemplos de revistas brasileiras que receberam apoio de editais públicos nos últimos anos estão Azougue, Tatuí, Urbânia, Número e Piseagrama. [nota do coletivo editorial do Fórum Permanente]

[2] No final do ano passado o MinC havia decidido ampliar a seleção de revistas do Programa Cultura e Pensamento de quatro revistas para vinte revistas, mas até aqui somente as primeiras quatro estão sendo produzidas e começaram a circular. O edital em andamento Procultura, que teve suas inscrições encerradas em 10 de janeiro de 2011 e que contemplaria dez projetos de revista de Artes Visuais, sendo cinco impressas e cinco online, pelo período de dois anos,  foi aparentemente cancelado pelo MinC. O blog dedicado ao Procultura agora diz “Nova Lei Rouanet” e tanto MinC como Funarte se recusam a falar sobre o andamento do edital por email ou telefone. O curioso é que na homepage do MinC ainda existe o botão “Procultura” (mas leva ao tal blog da Nova Lei Rouanet) e na página da Funarte os editais Procultura estão entre os “destaques”, sem atualizações desde janeiro de 2011. O blog dedicado à Lei Rouanet ainda contém os posts anteriores relacionados ao edital, apesar de terem substituído a chamada geral da página por “Nova Lei Rouanet” e de todos os posts recentes serem ligados a esta lei. [Nota do coletivo editorial do Fórum Permanente]